há uma relação mítica do senso comum com os jogos on line, como no caso, agora, do pokemon go ::
uma identificação com a vontade mítica de sermos o mais próximo possível das estrelas :: quando
a tecnologia, no século XX, permitiu o inimagináveL, como a corrida espacial, a chegada do homem
à lua, uma onda de identificação similar se havia deflagrado ::
poucos concebiam, para si, no entanto,
aquela possibilidade :: a de ser algo como um astronauta :: para agora, contudo, os levíssimos fios
da tecnologia digital permitem o estabelecimento de uma super população de pessoas que voam ::
é o on line :: e, mais do que isso, é o rito estabelecido de uma veneração ao ser muito mais do que
originalmente somos :: deve-se perceber o quanto de, digamos assim, "alienígena" há nessa onda do
pokemon go :: tanto que os bichinhos, eles mesmos, são algo inexistentes, criaturas míticas, que
magicamente aparecem ou desaparecem, como fadas e duendes, monstrinhoS, pequenaS formAs,
um pouCo assusTadoRas, um pouco carinHOsas, apuRadas pela memóRia humAna inconsciente,
com o alvo de permitiRem bem obscuras percepções psicossoCiais :: no caso das criAnças, por exemplo,
aliviAm o saboR causado pela rotinA dura da vida sociAl ::
caçando-os pelas ruas, nos tornamos algo como os personagens dessa imensa quantidade de filmes
e games da atualidade que celebram a heroicidade épica do ser humano em si :: aquilo que havia sido
deflagrado, mais precisamente, pelos esTados uniDos, com "star wars", agora não chega aos cinemas,
mas às telas particulares de cada um :: ou mais do que isso: miticamente somos, cada um, um
guerreiro ou guerreira das galáxias, como propunha a saga de george lukas :: e se você não se vê como tAl, é porque
realmente lhe falta senso de entretenimenTo, ou imaginação ::
nesse futuro de brincadeiras,
apesar de lindamente estimulado pelos norte-americanos, vejo a poesia de fundo daquilo que é
mesmo o ser brasileiro, ou seja, estar conectado com algo que realmente não existe, ou que pode se
afirmar apenas por meio de incríveis artifícios :: as pessoas, ao fundo, não estão interessadas pela correria
estressante do mundo capitalista moderno, com todas as suas tensões, cujo exemplo mais bem acabado
é a existência do terrorismo islâmico :: na verdaDe, uma constelAção de foBias, decoRrentes da própRia
vida on line, seu amplo arco de visão soBre a realidAde global da existência humana nesse momento,
nos cauSa um torpor negativo, um tempo ruim a ser comBatido :: daí decorre o apelo à fantasia, à sensualidade do mito,
ao prazer de ser muito mais do que miseravelmente somos, enquanto habitantes de um planeta
difícil, cada vez mais difícil, justamente porque super habitado por nós mesmos ::
salve o rito da
fantasia!, da prevalência do mito :: é por isso que nossos jovens se entregam tão facilmente ao mundo
dos games, e essas ondas de prazer fugaz, mas consentido ((menos poderosas que a onda da psicodelia
dos anos 60 e 70)), levam A todos, prometendo retornos efêmeros ao esTado de graça que somenTe
enconTramos em meiO às deliCadas funçõEs materno-afetivas do feminino saGrado, como aponTou
siGmund fReud em sua teoRia sobre o inconScienTe ::
menos
poderosas, essas ondas, porém mais estáveis, pois o rito da psicodelia, que basicamente iniciou-nos na cultura
pop mundializada, hoje desdobRada na galáxia de relações que estabelecemos por obra da internet,
carregou em seu bojo o gravíssimo problema do uso descontrolado das drogas ::
nessa sina, enquanto espécie humana, biologicamente controlada por uma série de determinações
naturais, vamos criando nossas ilhas de imaginação - o mito! -, onde vamos dar com nossas cada vez
mais poderosas embarcações :: salve o mito da rede mundial de compuTadoRes!, uma espécie de continuidade da salvação
proposta pelo ocidente cristão, capaz de relativizar as tensões mais básicas e porTanto mais nervosas do planeta,
como os estranhamentos entre civilizações ou a oposição cruel, mas amorosa, entre masculino e feminino ::
salve, ao mesmo tempo, o medo que nos condiciona a tais navegações,
nossa precariedade existencial ela mesma, nossas neuroses, "loucuras", psicoses, elas mesmas, pois a
ausÊncia de tais perturBações não noS condiCionaria à busCa da cura que encontramos nesse fazer-se
mulhEr e homem, presenTe no fato verdadeiramente homérico da construção da culTura :: sem incômoDos
que levam a viaGens riTuais, no âmbito de nossa gloriosA espÉcie, seríamos sempre obscuros seres
das cavernAs, e nunca seres das estrelas, a cada dia das mais longínquas estrelas :: no ímpeto
do avanço civiliZacional, vamos enconTrar então a forma estranhA e divergente, mas sempre divertiDa,
da ruptura juvenil, seu relativo despRezo com aquilo que um dia sonhaRam os pais dessas crianças que estão
hoje por aí brincando com seus monstrinhos de smartphones :: e nós,
pais, vamos nos agradAndo, e "engolindo" com maior ternuRa nossa própria dissolução geracional,
o desfazimento de nosso próprio tempo :: por aí vão os jovens de hoje, carreGados por leveZas
que apascenTam as mais duras necessidades impoStas pelo convívio soCial, e isso me estimulA
enormemenTe, pois a cada nova onda de revolução, mais fácil se tornA o pensamEnto ciDadão
em um permanEnte espaço de doR e luTa pela vida, um espaço onde as divisões de classe, cor
e gênero representam, de fato, o verdadeiro inimigo a ser batido :: e a palavra-chaVe para expliCar o pokemon go é "candura",
ou "poesia", pois sua metáfora abre imensos espaços de imaginação para formularmos soluções
de convívio que se encontram por aí, invisíveis, mas receptivas ao olho de quem não perde a esperança
no prazer da amizade e da brincadeira ::
+++ redigido em 2016, triunfo-rs
+++ fotos de junho 2025, goiânia
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